Sinopses de Filmes

C
"O Chamado", de Gore Verbinski (2004)
“O Chamado” , de Hideo Nakata (1998)
"O Chamado 0”, de Norio Tsuruta (2000)
"Os Corruptos", de Fritz Lang (1953)
"Crash - Estranhos Prazeres", de David Cronenberg (1996)
"Cidade de Deus", de Fernando Meirelles (2002)
"Corpo Fechado", de M. Night Shyamalan (2000)
"Clube da Luta", de David Fincher (1999)
"Chantagem e Confissão", de Alfred Hitchcock (1929)
“Christine – O Carro Assassino”, de John Carpenter (1983)
"O Chamado 2”,
de Hideo Nakata (2005)
“O Corvo”, de Roger Corman (1963)
“Cabiria”, de Giovanni Pastronne (1914)
“Carta de uma Desconhecida, de Max Ophuls (1948)

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"O Chamado", de Gore Verbinski (2004)


Filme de suspense e terror, baseado no japonês Ringu, de Hiroshi Takahashi. Rachel, interpretada por Noami Watts, é uma jornalista que tenta investigar a morte de quatro jovens ocorridas sete dias após terem assistido a uma misteriosa fita. Ela encontra o vídeo e o assiste, recebendo também o estranho telefonema de que morrerá sete dias depois. A partir daí ela começa uma corrida contra o tempo, buscando descobrir de onde teria surgido aquele vídeo, antes que ela, e mais tarde, seu ex-namorado e seu filho, sejam vítimas da mesma horrível morte que sofreu os quatro jovens. Tal como O Grito (The Grudge), de Takashi Shimizu, em sua versão norte-americana (de 2004), The Ring busca aproveitar o sucesso do japonês Ringu, de Hiroshi Takahashi, que já está em sua terceira seqüência (em 2005, Hollywood promete O Chamado 2). Em The Ring, os mortos voltam para destruir os vivos, utilizando-se da tela do vídeo e do telefone, aparatos tecnológicos predominantes no cotidiano das sociedades burguesas. A crise de civilização que atinge o capitalismo no Japão desde década passada, contribui, de certo modo, para a proliferação de filmes bizarros e de terror que servem de inspiração para Hollywood. Desde muito tempo, o Ocidente encontra inspiração criativa no Japão, seja através dos métodos de gestão just-in-time, seja através dos acervos de big monsters (como Godzilla). Ora, a partir do crash do capitalismo no Japão na década de 1990, com a modernização exacerbada dilacerando elementos tradicionais da sociabilidade nipônica, surgiram, com intensidade inédita, formas múltiplas de estranhamento. A perda da tradição e dos lastros culturais do passado e sua irremediável ocidentalização, com total imersão na lógica da mercadoria, está contribuindo para a crise de identidade e o surgimento de formas regressivas (e necrófilas) de imaginário social. Por isso, The Ring pode ser considerado expressão da estética de horror e de bizarrice que permeia a sociedade burguesa no Japão. No plano sócio-estético, o terror do desconhecido tende a se expressar através das narrativas de horror, cuja temática predominante é a volta dos mortos, seja como aparições estilo zumbies, seja como fantasmas ressentidos, sedentos de vingança contra os vivos (é interessante que, em The Ring, o fantasma possui uma dimensão virtual, utilizando-se de aparatos tecnológico predominantes no cotiadiano burguês, como vídeo e telefone). Talvez possamos considerar tais narrativas do estranhamento como sintomas da nostalgia inconsciente da tradição negada pela modernização exacerbada num contexto de crise estrutural do capital (por exemplo, desde a Primeira Revolução Industrial, no século XIX, tornaram-se clássicas, na literatura universal, de Daniel Defoe e Guy de Maupassant, histórias de fantasmas) [Topo].
(2004)


 

"Os Corruptos", de Fritz Lang (1953)


Em The Big Heat, de 1953, Dave Bannion, interpretado por Glenn Ford, é um detetive de policia que, ao buscar a verdade do suicídio de um colega de trabalho, se defronta com um esquema de corrupção infiltrado no Departamento de Policia. É pressionado para que abandone o caso. Ao ter a mulher assassinada, decide fazer justiça com as próprias mãos. Tal como em Vive-se uma só vez (You Only Live Once), de 1937, Fritz Lang trata de instituições sociais que se voltam contra um cidadão comum. No caso de The Big Heat, é a instituição policial que está degradada pela corrupção. É contra ela que o justiceiro indignado reage e busca fazer justiça com as próprias mãos. De um lado, a sociedade burguesa degradada e suas instituições sociais; de outro o pequeno homem que busca justiça. É o ideal de justiça que move o herói problemático. A justiça como fonte da lei e do direito. Mas a indignação do herói hollywoodiano possui, antes de mais nada, uma motivação pessoal particular; no caso de The Big Heat, vingar-se do assassinato da mulher amada. É um tema candente na filmografia de Fritz Lang e que percorre os filmes de Hollywood (inclusive, este é o mote trágico do filme histórico, O Gladiador (The Gladiator), de Oliver Stone). Como já salientamos, é uma variação típica da Fábrica de Sonhos, principalmente nos dramas clássicos dos anos 1930: o individuo heróico contra o sistema do poder e do dinheiro. Se, em 1937, com You Only Live Once, tivemos um final trágico; em 1953, teremos um final feliz: Dave consegue indiciar os corruptos e voltar à instituição de polícia. Nesse caso, ao invés de You Only Live Once, a critica social é mitigada. Não é o sistema social (e suas instituições de policia e justiça) que está apodrecido, mas apenas alguns de seus membros. O próprio Lang assim se exprime, nesta citação tirada da crítica de The Big Heat, feita por Antonio Moniz Vianna: "O combate do indíviduo contra as circunstâncias - o eterno problema dos gregos antigos, o combate contra os deuses, o combate de Prometeu. Da mesma forma, hoje combatemos as leis e lutamos contra os imperativos que não nos parecem justos nem bons para o nosso tempo. Talvez eles sejam necessários daqui a trinta ou cinquenta anos, mas no momento não são. Estamos sempre combatendo." Um detalhe: são as mulheres nos filme de Lang que abrem veredas para o herói justiceiro encontrar o seu caminho. É o caso de Silvia Sydney em You Only Live Once e, em The Big Heat, isto é bem claro com Debby Marsh, interpretado por Gloria Grahame (ou mesmo da velhinha que indica o assassino da mulher de Bannion). [Topo]
(2004)

 


"Crash - Estranhos Prazeres", de David Cronenberg (1996)


Crash, teve a direção de David Cronenberg, sendo baseado no livro homonimo de J.G.Ballard. Após sofrer um grave acidente de carro, James Ballard, publicitário (interpretado por James Spader), se envolve com um grupo de pessoas, homens e mulheres entediados, que cultivam uma estranha tara: buscar emoção e prazer sexual em acidentes automobilísticos. São pessoas que preenchem o vazio estranhado de suas existências com a dor e a destruição dos corpos. Não importam, para esses aficcionados, as vítimas fatais, mutiladas e desfiguradas; apenas o prazer do autoflagelamento é glorificado. Estamos diante da pura expressão do sentimento de necrofilia que tende a imprimir sua marca predominante no sistema do capital em sua fase de crise estrutural. Cronenberg expõe, de forma bizarra, as profundas implicações do fetichismo em alto grau que atinge as sociedades tecnológicas hipertardias. Em Crash, Cronenberg erotiza a tecnologia, na figura maquinal do automóvel. E pior: a erotização da tecnologia como máquina mortífera. Enfim, o prazer sexual é, de forma perversa, mediado (e subsumido) pelos objetos tecnológicos complexos determinados pela sociedade da produção destrutiva. Sexo pervertido (e invertido), tecnologia em contínua obsolescência e morte, ou dilaceramento de corpos, estão inextricavelmente interligados no thriller de Cronenberg. Como dica, o interessante site jgballard.com, sobre o autor que inspirou David Cronenberg neste filme.[Topo]
(2004)

 

 

“O Chamado”, de Hideo Nakata (1998)
"O Chamado 0”, de Norio Tsuruta (2000)

 

Reiko Asakawa, interpretado por Nanako Matsushima, é uma jornalista que tenta desvendar o mistério de uma estranha lenda urbana associada à morte de sua sobrinha e de mais quatro jovens: após assistir uma estranha fita de video, o telefone toca e a partir daí, você tem apenas sete dias de vida. Filme de terror japonês de sucesso que teve remake norte-americano: O Chamado (The Ring), de 2004. Embora o filme de Hollywood tenha décor mais sofisticado, a versão japonesa original possui alguns detalhes narrativos curiosos. Por exemplo, em Ringu, para se livrar da maldição do vídeo, precisa-se assisti-lo e depois reproduzi-lo, passando para outra pessoa. Ou seja, a forma de difusão da maldição ocorre através da reprodução pirata deste vídeo estranho. E a maldição se difunde através do medo da morte. Ringu teria uma continuação em 1999 (Ringu 2), dirigido por Hideo Nakata, e em 2000, Ringu 0, dirigida por Norio Tsuruta. Ringu 0 apresenta, de modo retrospectivo, a gênese da maldição do vídeo, a história trágica da jovem Yamamura Sadako (interpretada por Yukie Nakama), a aparição pavorosa do vídeo que atormenta os vivos em Ringu e Ringu 2. Nessa filme retrospectivo, Sadako se torna uma atriz de teatro que busca escapar do trágico passado. Entretanto, não consegue se livrar das visões estranhas e terríveis. Novamente, temos o mote narrativo do passado pavoroso que retorna através da aparição de mortos e o presente de terror assolando o mundo dos vivos. O Japão tornou-se, nos década de 1990, a "nova pátria do terror" (na expressão da Revista Veja ao comentar o lançamento O Chamado, a versão americana, no Brasil). Como já salientamos, isto decorre da crise estrutural do capitalismo no Japão, dilacerando a vida social e explicitando a natureza estranhada da ordem sócio-metabólica do capital. Um estranhamento social agudizado pela crise sócio-metabólica que se explicita através da estética do terror. Para acompanhar a estética fílmica de terror e sangue do Japão da crise dos 90’s, é interessabte o site SnowbloddApple.[Topo]
(2004)

 

 

"Cidade de Deus", de Fernando Meirelles (2002)

Buscapé, jovem negro, fotógrafo do Jornal do Brasil, morador da favela Cidade de Deus, narra a evolução desta favela do Rio de Janeiro, através da trajetória de Dadinho, depois Zé Pequeno e seus comparsas. Das origens na década de 1960, com o surgimento da primeira gang de assaltantes, até primórdios dos anos de 1980, onde o grande negócio é boca de fumo e narcotráfico, acompanhamos o desenvolvimento da marginalia da favela Cidade de Deus. Na ótica de Meirelles, crianças e jovens marginais são bandidos quase por natureza, jogados no mundo e destinados à morte (observe-se a construção da personalidade cruel e sádica de Zé Pequeno, desde criança). Por outro lado, é perceptível a ausência do Estado político, que só aparece para reprimir ou corromper. Apesar de estar no município do Rio de Janeiro, a favela Cidade de Deus é, em si, um pequeno mundo, mundo de barbárie, imerso num estado de natureza. É claro que é local de moradia de trabalhadores pobres da cidade do Rio de Janeiro (por exemplo, Mane Galinha era cobrador de ônibus). Mas o que o filme expõe é um universo infernal de dissolução social assolado pela pobreza. Por outro lado, são perceptíveis formas de sociabilização e de resistência cultural ainda que bastante precárias (por exemplo, em fins dos anos 1960, o entretenimentos para jovens, crianças e adolescentes da Cidade de Deus eram as peladas de futebol de areia e mergulho no riacho; com a expansão urbana degradada, no decorrer dos anos 1970, os únicos espaços de sociabilidade parecem ser os bailes populares). Na verdade, a sociabilidade se degrada na mesma medida da degradação do espaço urbano. O filme Cidade de Deus nos apresenta quase trinta de historia do Brasil, visto através do mundo da favela. É importante apreendermos a constituição do espaço de barbárie social pelo pelo próprio Estado capitalista periferico em crise estrutural. Na verdade, a favela torna-se gueto social, fértil para os negócios escusos da droga. O filme tende a apresentar cenas fortes da criminalidade nas favelas do Rio de Janeiro, verdadeira guerra civil, a neoguerrilha urbana dos anos 1980 até nossos dias. Embora evite apresentar o espetáculo da violência urbana, sua intensidade não deixa de impressionar e entreter o público, paralisando a reflexão critica sobre a crua realidade social brasileira. De qualquer modo, o filme possui interessantes detalhes que podem propiciar um longo (e primoroso) debate sobre a degradação social das metrópoles brasileiros nos últimos trinta anos.[Topo]
(2004)

 

Corpo Fechado, de M. Night Shyamalan (2000)


David Dunne, interpretado por Bruce Willis, é um agente de segurança, único sobrevivente de um desastre de trem. Ellijah Price (interpretado por Samuel L. Jackson) é um negro, colecionador de estórias em quadrinhos, que sofre um de uma doença nos ossos, deixando-os frágeis, que acredita que David é um tipo de herói inexpugnável, seu antípoda, e tenta convencê-lo disso. Drama fantástico de M. Night Shyamalan, que trata, em seus filmes, da perda de sentido existencial do homem moderno, da sua crise de Identidade. Como pano de fundo histórico, temos a crise do Império norte-americano e os impasses do capitalismo global no século XXI. Em Unbreakable, tanto David quanto Ellijah estão carente de narrativas e de um lugar no mundo, estando, deste modo, susceptíveis a alucinações fantásticas. Nos filmes de M. Night Shyamalan, os personagens são anti-heróis imersos em seus dramas (e dilemas) existenciais. Neles, o enredo fantástico impregna (e é parte) do cotidiano de homens comuns. Aliás, o fantástico em Shyamalan é uma dimensão de transcendência estranha, que prenuncia situações-limites de uma sistema sócio-metabólico em sua fase de crise estrutural. [Topo]
(2005)

 

"Clube da Luta", de David Fincher (1999)

O narrador do filme, Jack (interpretada por Edward Norton) é um executivo yuppie que trabalha como investigador de seguros de uma grande montadora de automóveis. Desiludido da vida, ele busca driblar suas crises de insônia e extravasar sua ansiedade em sessões de terapia grupal, ao lado de pessoas com câncer, tuberculose e outras doenças. É só no meio de moribundos que Jack se sente vivo e assim consegue dormir. Sua alegria só é interrompida pela chegada de Marla Singer (interpretada por Helena Bonham Carter), uma viciada em heroína com idéia fixa de suicídio. Repentinamente entra na sua vida o carismático Tyler Durden (Brad Pitt) que irá lhe apresentar um novo modo de vida, capaz de aliviar sua tensão existencial, o clube da luta, um clube de subcultura anárquica, onde homens põe à prova seu instinto animalesco em combates corporais. Fight Club expõe, com traços non-sense, a degradação existencial do homem na civilização burguesa. O agudo estranhamento em suas múltiplas dimensões se manifesta em sentimentos de necrofilia, de dessocialização, de desencantamento e de atitudes irracionalistas dos mais amplos espectros. A profunda frustração com a vida sem sentido é o terreno propicio para as manifestações de pura agressividade e de auto-destrutividade. O clube da luta sintetiza, em si, o espírito do mundo burguês degradado, em sua etapa neoliberal, imerso na lógica do mercado e da concorrência. Na verdade, a sociedade capitalista, em sua etapa de crise estrutural, de pleno irracionalismo, de vazio utópico e de agudo desencantamento com as possibilidades de transcendência da lógica da mercadoria, produz em si, elementos de colapso da vida pública e da sociabilidade. Ela contém os germes de destrutividade da própria civilização (o que os atentados terroristas de 2001 iriam demonstrar). Deste modo, Fight Club é um filme visionário das misérias do capital no vindouro século XXI. Produzido em 1999, Fight Club expõe, de forma quase fantástica, numa narrativa de estilo pós-moderna, ou seja, fragmentária e não-linear, os desvarios existenciais do capitalismo global, às vésperas do estouro da bolha especulativa em Wall Street.[topo]
(2005)

 



"Chantagem e Confissão", de Alfred Hitchcock (1929)

 

Na Londres dos anos 1920, Alice White é uma jovem, filha de lojista, que namora Frank Webber, detetive da Scotland Yard, que se dedica mais ao trabalho do que a ela. Insatisfeita, Alice decide se encontrar com outro homem, o pintor, interpretado por Cyril Richard, que tenta estupra-la em seu apartamento. Alice mata acidentalmente o pintor e foge do local do crime. Por ironia, Frank é o policial encarregado das investigações do crime. O pior é que Alice e Frank passam a ser chantageados por um homem que testemunhou o crime. Filme de suspense do jovem Alfred Hitchcock. Blackmail é o primeiro filme sonoro da Inglaterra e do diretor Hitchcock. Foi concebido como filme mudo, tornando-se depois, filme sonoro. Por isso, é perceptível em seu desenrolar, a mise-em-cene do filme mudo. Já em seus primeiro filmes, Alfred Hitchcock ensaia suas clássicas aparições (ele aparece em cena como um passageiro no metrô que é importunado por um garoto). Uma cruel ironia marca a narrativa de Blackmail e se expressa no riso sarcástico da pintura do palhaço que ri, obra do pintor assassinado por Alice (vide acima). O que podemos nos interrogar: o palhaço ri de quem? Dos jovens namorados, isto é, da mulher insatisfeita e do dedicado detetive da Scotland Yard ? Ou do próprio público, imerso na trama de suspense e de chantagem que põe em questão, diante das contingências da vida, valores caros do mundo burguês como o amor romântico e a fidelidade profissional ? [topo]
(2005)

 

 

 

“Christine – O Carro Assassino”, de John Carpenter (1983)

 

 

Produzido em 1983 e baseado em romance de Stephen King, Christine conta a saga de um carro amaldiçoado, um Plymouth Fury 1958 e a trilha de tragédia e mortes que o acompanha, até o apocalíptico final. Adaptado pelo roteirista Bill Phillips, o filme começa nos apresentando o adolescente Arnie Cunningham (interpretado por Keith Gordon), feio, magricela e sem atrativos, e que tem como único amigo, o jovem atleta Dennis Guilder (John Stockwell). Certo dia, Arnie adquire um carro extremamente deteriorado à beira da estrada e utilizando seu talentos de mecânica de automóveis o recupera com perfeição. Aos poucos, Arnie passa por mudanças perceptíveis de atitude e comportamento em relação à família, amigos e escola, aparentemente influenciado pelo maldito carro, que chama de Christine, como o antigo dono fazia. Uma curiosidade: o rádio de Christine só pega músicas dos anos 1960 e as músicas refletirem o estado de espírito do carro nas diferentes situações. Filme fantástico que trata do poder manipulatório, quase demoníaco, do automóvel na civilização do capital. É interessante destacar a transformação que o sujeito, o rapaz Arnie, sofre devido a posse do objeto que se fez coisal (o carro assassino). É a expressão clássica do estranhamento e do feticismo da mercadoria no sentido marxiano (o automóvel é a mercadoria mais complexa da sociedade burguesa). Vale salientar também as cenas em que Christine se conserta sozinha e a capacidade do automóvel de se comunicar através da música pop. Símbolo-mor do estilo de vida fordista, o automóvel aparece como uma mercadoria maldita, representação alegórica (e fetichizada) da crise do americanismo e da própria crise estrutural do capital, desenvolvida a partir de meados da década de 1970 (o filme é de 1983). Um detalhe: o filme começa com a produção do carro assassino na linha de montagem fordista na fábrica em Detroit, berço da indústria automobilística americana na década áurea do fordismo (os anos 1950).[topo]
(2005)

 


“O Chamado 2”, de Hideo Nakata (2005)





Seis meses depois dos terríveis eventos que aterrorizaram Rachel Keller, interpretada por Naomi Watts, e seu filho Aidan (em O Chamado, dirigido por Gore Verbinski), mãe e filho tentam deixar para trás lembranças assustadoras de Samara e sua amaldiçoada fita de vídeo, mudando-se de Seattle para AStoria, pequena comunidade litorânea no Estado do Oregon. Ali Rachel espera recomeçar a sua vida, mas logo percebe, por meio das evidências de um crime local, que incluem uma fita de vídeo, que a vingativa Samara está de volta, mais determinada que nunca a continuar o seu incansável ciclo de terror e morte. Continuação do filme norte-americano baseado no horror japonês The Ring e que teve na direção, Hideo Nakata (que dirigiu a versão original japonesa). The Ring Two, como versões anteriores, no Japão e EUA, retoma o mote da volta dos mortos: a jovem Samara, espírito ressentido, que leva à morte, jovens que assistem fita de vídeo maldita. Entretanto, nesta reedição, o mote original da série de horror se dissipa. A fita de vídeo (e o telefone chamando) deixam de ser o destaque do suspense e fica só a perseguição implacável do espectro de Samara à Rachel e seu filho Aislan. No decorrer do filme, percebe-se que a causa do ressentimento mortal do espírito inquieto de Samara é a falta de afeto materno. Na verdade, o foco temático são os problemas da juventude imersa em espectros fantasmáticos do passado, de uma ordem social incapaz de abrir horizontes de futuridade. No caldo do individualismo da ordem neoliberal, o que resta, no plano do imaginário narrativo, é o medo e o horror fantástico. [topo]
(2005)

 

 

“O Corvo”, de Roger Corman (1963)

Adaptação livre do poema clássico de Edgar Allan Poe (com roteiro de Richard Matheson). Esta comédia de humor negro da Hammer conta com a presença de ilustres atores consagrados ao horror, como Boris Karloff, Vincent Price e Peter Lorre. O Dr. Erasmus Craven, bruxo medieval, utiliza sua poção mágica para trazer de volta o Dr. Adolfo Bedlos, convertido em corvo pelo bruxo rival, Dr. Scarabus. Através dele, Erasmus sabe que sua adorável Lenore não está falecida, mas viva no castelo do bruxo rival e decide resgata-la, com a ajuda de sua filha, Estelle e do filho de Adolfo (Jack Nicholson, em começo de carreira). Daí em diante a trama se desenrola com muita ironia no confronto dos magos até o duelo final que não é menos do que antológico e surpreende pelo bom nível dos efeitos especiais que dão vazão às mágicas de ambos os bruxos. O filme contém sugestões filosóficas curiosas: foi a presença do corvo que contribuiu para que o bruxo Erasmus pudesse abandonar suas terríveis ilusões a respeito de sua falecida Lenore, que demonstrou ser uma mulher ambiciosa e fútil. O que significa que, mesmo bruxos, mestres da arte do ilusionismo, tendem a se prender a ilusões a respeito das pessoas amadas. Na verdade, o filme retrata, com agudo senso de humor negro, o processo de negação do passado e de suas terriveis mistificações. Roger Corman repetiria sua parceria com o trio Karloff, Price e Lorre (além de outros mitos do horror como Basil Rathbone, Christopher Lee e Ray Milland) em vários outros filmes, adaptando ora Edgar Allan Poe, ora H. P. Lovecraft, em filmes como “A Queda da Casa de Usher” (1960), “O Poço e o Pêndulo (1961), “Muralhas do Pavor” (1962), “O Terror” (1963), “Farsa Trágica” (1963), “O Castelo Assombrado” (1963), “A Máscara Mortal” (1964) e “O Ataúde do Morto-Vivo” (1969). [topo]
(2005)

 

 

 

“Cabiria”, de Giovanni Pastronne (1914)


 

No século III A.C. durante a última guerra púnica, a pequena Cabiria é raptada pelos fenícios que a vendem aos cartagineses, o qual vão imola-la aos deus Moloch. O romano Fulvio Axilia, com seu amigo Maciste, impedem seu sacrifício fazendo-a fugir. Os anos se passam e enquanto Aníbal atravessa os Alpes, Siracusa é atacada pelos romanos que são vencidos graças à invenção de Arquimedes que destrói os barcos republicanos. Cabiria já adulta, vive na corte da rainha idumeia Sofonisba que repudiou o marido Massinissa para viver junto com Siface, lugar-tenente de Asdrúbal e irmão de Aníbal. Scipião desembarca na África e é acompanhado por Fulvio Axila, que toma conhecimento que Cabiria é escrava de Sofonisba. Mobiliza seu amigo Maciste que, após a batalha de Zama, liberta a jovem, restituindo a ela a liberdade perdida desde o tempo dos cartagineses. Épico clássico do cinema mudo italiano que expõe cenas históricas (e míticas) da Antiguidade romana e o drama trágico da pequena Cabiria. Antes de D.W. Grifithh, o pai do cinema moderno, Giovanni Pastrone já demonstrava a magia do cinema épico, capaz de expressar dramas grandiosas de personagens míticos e históricos ao lado de pequenos dramas de personagens cotidianos imersos em situações de tragédia (como erupção vulcânica e guerras). Com Pastrone e Grifithh o cinema aparece como arte totalizadora da vida social. Nele sociedade e natureza, história e mito, se confundem. [topo]

 

 

 

“Carta de uma Desconhecida”, de Max Ophuls (1948)

 

 

Filme clássico que retrata através de flash-back na Viena de 1900, a trágica paixão da jovem Lisa, abnegada heroína, por um músico libertino, o pianista Stefan Brand. Baseado em conto clássico de Stephen Zweig, a tragédia romântica de Ophuls expõe traços da sociabilidade burguesa. A paixão romântica de Lisa interpretada por Joan Fontaine é um objeto-fetiche que a aprisiona. Ela se sacrifica em prol da fantasia de amor que alimenta. Ela venera Stefan que aparece para ela quase como um semi-deus, presente e distante ao mesmo tempo. A construção dos personagens é deveras interessante: o fato de Stephen Brand ser pianista reforça o efeito onírico das fantasias românticas de Lisa. As sonatas de Stephen elevem seus devaneios de amor. A tragédia romântica se passa durante a Belle Époque, antes da I Guerra Mundial, na Viena capital do Império Austro-Hungaro, coração cultural da civilização burguesa afluente. Ao encontrar Lisa, Stefan simula um interesse amoroso, tão falso e imaginário quanto a “viagem de trem” que o casal experimenta no parque de diversões de Viena. É interessante que ele a chama de feiticeira, mas é ela que está encantada por suas próprias fantasias românticas. Enquanto Lisa vive no mundo encantado da paixão romântica, Stefan Brand, o músico, vive no mundo desencantado da relação instrumental e do artifício. Stefan é o homem burguês em sua forma extrema. Ele sente compulsão para seduzir jovens mulheres e depois esquece-las irremediavelmente. Apenas as consome, apagando-as de sua memória. Por isso Lisa, uma de suas fugazes conquistas amorosas, mãe de seu filho, é uma mera desconhecida. Na verdade, a relação instrumental que Stefan estabelece com seus objetos de conquista amorosa corroi sua memória. O que Ophuls (e Zweig) sugere é que, onde há fetichismo, não há memória. E onde não há memória, não há relação pessoal (e humana). Ora, Stephan é incapaz de relacionar-se. Entretanto, o mais curioso é que Lisa, com sua obsessão romântica, é tão incapaz quanto ele de relacionar-se, pois sua fantasia romântica a impede de ver o Outro como ele é. De certo modo, a tragédia romântica de Ophuls expõe um dos traços da relação entre os sexos no mundo burguês: de um lado, homens predadores que cultivam a lógica instrumental nos “relacionamentos” com o sexo oposto; homens incapazes de amar, mas de sugerir desejo e paixão; por outro lado, jovens mulheres sensíveis a fantasias românticas que se devotam a cultivar o objeto amado. Entretanto, outra mensagem do filme é que o verdadeiro amor é impossível em sociedade fetichizadas.[topo]